terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Como um cachorro babão salvou meu casamento

Pessoal, eu nunca fui muito fã de cachorro. Quando me casei, bem jovem (uns 27 anos), acabei decidindo com a minha esposa que a gente deveria ter um. Compramos um Golden Retriever. Na minha cabeça, aquilo era o “normal”: casou = tem que ter cachorro. Ponto.

Eu gostaria de dizer que isso acontece muito quando a gente é jovem demais. Quanto mais novo, menos personalizado a gente é. A maturidade, de certa forma, é o processo de individuação: você vai adquirindo experiência, sabedoria, bagagem, e começa a fazer uma triagem brutal daquilo que realmente combina com a sua essência. A história da vida de um homem é, basicamente, ele se associando cada vez mais aos elementos que se parecem com ele e se desfazendo do resto.
O sujeito imaturo carrega um monte de coisa que não é dele: herdou da família, do meio social, dos amigos de infância, da faculdade, da cultura, enfim. A minha escolha de ter um cachorro não veio de um amor intrínseco pelo animal. Veio porque “parecia óbvio” que uma família nova precisa de um cachorro novo.
Resultado: a experiência foi, durante anos, meio desagradável. O bicho adora morder meu braço (brincando, claro), espalha pelo chão tudo que é controlado, baba de forma formidável e marca toda a minha roupa de baba colante. Vive querendo carinho, vive querendo atenção e te encara com aquele olhar clássico de Golden Retriever sofredor, como se você estivesse devendo a alma dele em 12 parcelas com juros de Fórmula 1. Cada vez que você nega um carinho, parece que cravou uma espada no coração do coitado.
Sem falar na quantidade industrial de cocô. Um Golden tem quase 50 kg e caga proporcionalmente. Todo santo dia eu tenho que ir no jardim recolher aqueles tijolos biológicos, e de vez em quando piso numa bomba fora do radar.
Resumindo: eu tolerava o cachorro. Só isso.
Até que, recentemente, tive umas experiências que mudaram completamente a minha percepção.Percebi uma coisa: toda vez que eu faço carinho no cachorro, a minha esposa instantaneamente aparece do nada e vem fazer carinho em mim. É fatal. Ela pode estar no outro andar da casa, ocupada com qualquer coisa; basta ela me ver acariciando o cachorro que ela desce, se junta a nós e começa a me acariciar também. É como se o ato de dar atenção ao cachorro ativasse nela uma atração física automática por mim.
Testei a hipótese. Comecei a fazer mais carinho no cachorro (estratégia pura). Resultado? Recebi um volume de afeto da minha mulher que eu jamais imaginei que fosse possível depois de anos de casado.
Outro dia meus irmãos vieram de Londres e Portugal, a casa lotou, meus filhos dormiram com a minha esposa na cama master e eu fui parar no sofá com o cachorro. Dormi abraçado com ele. Descobri que o ronco do Golden me acalma profundamente. Foi uma paz que eu não sentia há anos. Hoje estou seriamente pensando em subir o cachorro pro quarto de cima (moro em sobrado) pra dormir do meu lado da cama.
Porque, né… se é pra roncar e ocupar espaço, que pelo menos venha com bônus de carinho da patroa.
Resumo da ópera: eu não virei aquele cara que acha cachorro “filhinho”. Continuo achando que baba, cocô e pelo são um saco. Mas descobri que, no meu caso específico, ter um Golden Retriever é o investimento afetivo-sexual com o melhor custo-benefício que já fiz na vida.
Vale cada tijolo de cocô recolhido no jardim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário