O indivíduo na modernidade encontra-se cada vez mais alienado da realidade concreta. As ferramentas que lhe são oferecidas para fugir do real são hoje extremamente poderosas e refinadas.
Entre elas destaca-se o design viciante do scroll infinito das redes sociais, que mantém o cérebro em estado permanente de excitação superficial e dá a ilusão de pertencimento. Temos também os videojogos, cada vez mais imersivos, que sequestram crianças e adolescentes desde tenra idade e os instalam em mundos paralelos onde o real parece pálido e sem graça. Há ainda a música contemporânea -- especialmente aquelas faixas de 3 ou 4 minutos perfeitamente calculadas para gerar emoções totalizantes. Quem ouve sertanejo, funk, trap ou gospel o dia inteiro acaba por não suportar mais o silêncio; qualquer experiência fora daquele casulo sonoro torna-se insuportável. Outros reagem ao vazio com comida compulsiva, banhos intermináveis, drogas ou qualquer estímulo que preencha o menor espaço de ausência.
Os mecanismos de fuga são infinitos e profundos.
Mas é possível reverter esse processo. Existem antídotos -- remédios antigos, hábitos quase esquecidos -- que têm o poder de reinstalar progressivamente o indivíduo no Real. Uma vez adquiridos, o silêncio deixa de ser um inimigo e passa a ser um dos maiores prazeres da existência.
Comece pela alta cultura literária: leia os grandes romances, aqueles que exigem atenção sustentada e mergulho profundo. Assista ao grande cinema -- não às séries rápidas da Netflix, mas a Fellini, Bergman, Tarkovski, Wenders, os mestres que filmavam o tempo, o rosto humano, o mistério da existência. Desenvolva alguma habilidade artística: pintura, desenho, um instrumento musical, escrita. Esses exercícios não são luxo, são treinamento de alma.
É exatamente como o paladar. A criança rejeita quase tudo que é novo ou complexo; o adulto que cultivou o gosto consegue descrever um vinho com trinta ou quarenta matizes diferentes. O mesmo acontece com a percepção da realidade: esses hábitos tradicionais vão, aos poucos, afiando os seus sensores. Você começa a notar perfumes que antes passavam despercebidos, texturas, diferenças sutis de luz e cor, o peso do ar, o som real das coisas.
Não se trata de forçar atenção mística aos detalhes. Trata-se de construir instrumentos internos -- lentes, antenas -- que só se formam com tempo e dedicação às artes antigas. Quando esses instrumentos estão prontos, o mundo real revela-se infinitamente mais rico do que qualquer feed, qualquer jogo, qualquer playlist.
O silêncio, então, deixa de ser vazio. Torna-se pleno. E você finalmente volta para casa.
Os mecanismos de fuga são infinitos e profundos.
Mas é possível reverter esse processo. Existem antídotos -- remédios antigos, hábitos quase esquecidos -- que têm o poder de reinstalar progressivamente o indivíduo no Real. Uma vez adquiridos, o silêncio deixa de ser um inimigo e passa a ser um dos maiores prazeres da existência.
Comece pela alta cultura literária: leia os grandes romances, aqueles que exigem atenção sustentada e mergulho profundo. Assista ao grande cinema -- não às séries rápidas da Netflix, mas a Fellini, Bergman, Tarkovski, Wenders, os mestres que filmavam o tempo, o rosto humano, o mistério da existência. Desenvolva alguma habilidade artística: pintura, desenho, um instrumento musical, escrita. Esses exercícios não são luxo, são treinamento de alma.
É exatamente como o paladar. A criança rejeita quase tudo que é novo ou complexo; o adulto que cultivou o gosto consegue descrever um vinho com trinta ou quarenta matizes diferentes. O mesmo acontece com a percepção da realidade: esses hábitos tradicionais vão, aos poucos, afiando os seus sensores. Você começa a notar perfumes que antes passavam despercebidos, texturas, diferenças sutis de luz e cor, o peso do ar, o som real das coisas.
Não se trata de forçar atenção mística aos detalhes. Trata-se de construir instrumentos internos -- lentes, antenas -- que só se formam com tempo e dedicação às artes antigas. Quando esses instrumentos estão prontos, o mundo real revela-se infinitamente mais rico do que qualquer feed, qualquer jogo, qualquer playlist.
O silêncio, então, deixa de ser vazio. Torna-se pleno. E você finalmente volta para casa.
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