domingo, 16 de novembro de 2025

As fontes da vida no coração

Nada mais dramático do que um temperamento fleumático combinado com uma mente de natureza filosófica. O lado fleumático te faz naturalmente adaptável a qualquer tipo de circunstância, ao passo que a natureza filosófica -- e a tendência irresistível à reflexão -- instala com frequência o individuo num tal estado de dúvida, que não se é capaz de afirmar praticamente nada sobre nada. Cada problema, cada disputa, produz na sua mente dezenas de argumentos a favor, e dezenas de outros contra para cada um dos lados em jogo.

Por que estou falando disso? Sim, acabei de me lembrar. É porque gostaria de dizer algo sobre a importância do nosso coração. Sobre o fato de que ele não se limita ao órgão de carne disposto ao centro do nosso peito, levemente destacado para o lado esquerdo. "No coração residem as fontes da vida", já dizia o sábio Salomão.

O fato é que recentemente tive uma espécie de encontro com ele, meu coração. Foi como se depois de anos de elucubrações e estudos acerca do seu funcionamento fisiológico, da sua simbologia, ele tivesse decidido se apresentar para mim -- dotado de personalidade e com o objetivo de estabelecer um diálogo.

- "Olá Eric, prazer. Eu sou o seu coração". Foi o que me sussurrou enquanto eu tomava banho -- pensar enquanto se toma banho é um dos grandes prazeres da vida -- e convenceu-me de que eu deveria lutar mais pelas coisas que amo, ao invés de simplesmente me adaptar às circustâncias (fazendo jus à descrição que fiz no primeiro parágrafo, quando mencionava os desafios de uma natureza à la fois fleumática e filosófica).

Ele se apresentou trazendo consigo a companhia de uma pontada no peito, que se parece com uma dor, mas não é exatamente uma. Sabe aquela sensação que você tem quando vai ao profissional que destrava as costas, cujo nome esqueci (sou péssimo com o vocabulário médico-farmacêutico em geral), e que após uma boa estralada, faz você se sentir como se tivesse ressuscitado dos mortos? Foi isso, misturado com a percepção de que a névoa negra que pairava em torno do meu coração estivesse desaparecendo, como a luz da noite que se desmancha na presença da aurora.

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